Depressão

(…) Uma tristeza profunda, um choro calado, um não existir, um aperto na alma
ou então raiva, irritação, quando nada basta e tudo incomoda
a perda da vitalidade, do brilho, do desejo de ser, de estar e de seguir adiante
uma culpa inclusive por isso
– ‘reage, isso vai passar’ ela ouve, como uma faca no peito
– ‘só quero ficar aqui, não tem como’ ela pensa
inundação de sentimentos negativos, a desvalorização de si mesmo, a perda da esperança pelo que está por vir
os dias que parecem não ter fim, ficando só a vontade de que a noite chegue
e quando a noite chega… ah, o cansaço que não se transforma em sono, horas solitárias de angústia. (…)

Enfrentar qualquer doença ao longo da vida é algo muito desafiador, intenso, desgastante. Mas enfrentar uma doença silenciosa, permeada de estigmas, sentir-se sozinho no meio da multidão faz com que a depressão seja corrosiva. Ouso dizer uma espécie de morte em vida.

Cuidar de quem deprime, tratar a depressão, é amparar, é devolver às mãos da pessoa a capacidade de ser quem ela é, é devolver o chão onde pisa, é trazer de volta a vitalidade. Não é possível saber o que cada um busca como sentido, propósito e satisfação para sua vida, não é possível saber sequer se cada um está buscando de fato ou só observando o tique-taque do relógio. Mas é um direito ter a liberdade de escolher fazer essa busca.
A depressão é uma doença ou um fenômeno cultural?

Como todos os transtornos mentais, o surgimento, a origem, a “causa” da depressão vem de uma combinação complexa de fatores genéticos (com os quais nascemos e pouco temos controle) e fatores ambientais (alguns modificáveis, outros nem tanto). Quanto maior a predisposição genética (familiares de primeiro grau com depressão, p. ex.) maior a chance do surgimento de um episódio depressivo ao longo da vida, maior probabilidade de início precoce (durante a infância e adolescência) e maior a chance de ser recorrente, ou seja, voltar a acontecer pela segunda, terceira vez ou até se tornar crônico.

Em relação aos fatores ambientais, quero dar ênfase ao que acontece na infância.
O período que transcorre desde a concepção, passando pela gestação, primeiros dois anos de vida (primeiríssima infância) e em seguida até os 6 anos de vida (primeira infância) é um período muito sensível para construção do “andaime” a partir do qual estruturamos toda nossa vida.

É nessa fase em que fatores ambientais como maus tratos, abusos (emocional, físico, sexual) e negligência podem provocar feridas profundas, moldar conexões neuronais desequilibradas e exercer uma forte pressão no material genético, aumentando significativamente a chance de transtornos mentais na vida adulta, em especial a depressão.

Apesar de já termos conhecimento suficiente sobre a importância de protegermos a primeira infância (incluindo cuidados com as famílias em período gestacional e puerperal) inclusive para melhores resultados econômicos e sociais, ainda são escassas as ações, as estratégias tanto individuais quanto coletivas.
Ressalto que cuidar da primeira infância não é ceder aos desejos de uma criança e protegê-la de todas as frustrações.

Cuidar da infância é garantir nutrição, proteção física (moradia, vestimentas adequadas), vacinação, livre brincar, contato com natureza, e, principalmente, ter adultos cuidadores capazes de compartilhar afetos, atenção, oferecer segurança emocional e impulsionar para os desafios da vida.

Na balança da resiliência temos de um lado os fatores de risco, sejam os eventos precoces, sejam eventos da vida como luto, doença, crise financeira etc, e do outro lado os fatores de proteção, como um andaime firme, uma vida de hábitos saudáveis, autoconhecimento e conexões sociais.

Diante dessa balança tendo a acreditar que vivemos momentos difíceis, com uma pressão muito grande sobre estruturas nem sempre sólidas, pendendo para o desequilíbrio que pode assumir a proporção de uma fase de angústia e sofrimentos inerentes à vida ou levar de fato ao adoecimento.

Importante lembrar que mesmo para aqueles com grande resiliência, a depressão pode se instalar sem pedir licença, não é preciso um “motivo” para entrar em depressão.

Também é importante lembrar que sofrimento não tem “régua”, não é possível comparar situações de vida e qual seria mais digna de pesar, pois cada indivíduo tem uma história única.

Apesar de usarmos critérios bem definidos para afirmar se uma pessoa está deprimida, cada depressão é única, cada história é única.

Para além do tratamento farmacológico e manejo dos sintomas, buscamos sempre acolher o momento, dando segurança e confiança durante a recuperação, ao mesmo tempo em que trilhamos o fortalecimento das estruturas.

Cuidar de quem deprime, tratar a depressão, é amparar, é devolver às mãos da pessoa a capacidade de ser quem ela é, é devolver o chão onde pisa, é trazer de volta a vitalidade.

Não é possível saber o que cada um busca como sentido, propósito e satisfação para sua vida, não é possível saber sequer se cada um está buscando de fato ou só observando o tique-taque do relógio.

Mas é um direito ter a liberdade de escolher fazer essa busca.

(…) O que fazemos quando nosso coração dói?
– pergunta o menino.
Nós o acolhemos com amizade, lágrimas compartilhadas e tempo, até que ele volte a despertar esperançoso e feliz. (…)

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