Ansiedade

(…) – Aprendi a viver o momento presente.
– Como? – perguntou o menino.
– Encontro um lugar tranquilo, fecho os olhos e respiro.
– Legal. E depois?
– Depois eu me concentro.
– Você se concentra em que?
– Em bolo – disse a toupeira. (…)

Conseguir compreender de uma forma única e simplificada os fenômenos da ansiedade já se tornaram alvo de muitos estudos e ainda hoje considero uma missão difícil. Se levar em conta tão somente a categorização de sinais e sintomas, o desafio diagnóstico e as opções de tratamento, são transtornos relativamente simples dentro da psiquiatria. Porém a origem e a natureza do medo, as preocupações e as reações físicas vão assumindo contornos tão diversos em cada indivíduo.

Um frio na barriga diante de uma nova tarefa desafiadora (“fui promovido e agora terei que liderar uma equipe em que a maioria das pessoas são mais velhas do que eu”); um estado de alerta constante (“fui assaltado, quebravam o vidro do meu carro e agora toda vez que vou dirigir não consigo desligar”); um estado de agitação (“minha esposa acabou de receber diagnóstico de câncer, somos dois autônomos, temos 2 filhos, não sei como vou dar conta de tudo”); uma sensação de esgotamento profissional (“todo domingo à noite começo a me sentir mal e todo dia ao acordar e lembrar que preciso ir para aquele lugar, já começo a ter diarreia, meu coração fica acelerado”).

Um menino de 6 anos que não consegue entrar na escola, que não permite que os pais saiam da sua presença sequer para ir à padaria, que fica tomado pela angústia de que algo muito ruim aconteça nesse distanciamento. Outro menino de 9 anos que não entra em elevadores, mesmo morando no 24º andar. Caso esqueça de colocar algo na mochila de manhã, “deixa para lá”, vai sem mesmo. Não desce para brincar, com “preguiça” de subir e descer todas as escadas. Deixa de visitar a casa de amigos com vergonha de expor seu medo.

Uma adolescente de 13 anos que diante de tantas mudanças e estranhamentos com seu corpo e com seus grupos sociais, agrava um perfil de timidez e agora já não consegue mais fazer uma apresentação na sala de aula, não consegue fazer o pedido de seu almoço para um garçom, teme ao extremo a reprovação, a humilhação ou qualquer julgamento externo, se fechando em um pequeno mundinho de “segurança”. Temos também aqueles que não conseguem entrar num vagão de metrô, num avião ou numa piscina. Inúmeros homens e mulheres que vivem em extremo estado de tensão, com preocupações com assuntos do cotidiano (geralmente trabalho, dinheiro, conflitos nos relacionamentos ou questões de saúde) que tomam conta do dia, trazendo dificuldade de concentração, irritação e até dores físicas (dor de cabeça, dor cervical, dor lombar); e ao chegar da noite são invadidos por pensamentos sobre o que precisam fazer, o que deixaram de fazer e tem o sono afetado.

Em todo esse meandro surgem “ataques” com descontrole total sobre o que se pensa e o que se sente. Pode até ser rápido no relógio, 10-15 min, mas a sensação é infinita, pois o corpo simplesmente descarrega: coração acelerado, nó na garganta, aperto no peito, falta de ar, tremedeira, formigamento, sensação de morte iminente. Quando não vem em forma de ataque de pânico, pode vir de forma mais insidiosa, como uma dor de cabeça, uma sensação de sufocamento (o ar que não entra), o tum-tum do coração batendo alto, por horas e horas. Algumas vezes com causas específicas, outras vezes sem nenhuma lógica. Quantos passam anos buscando serviços de emergência e realizando exames na busca por esclarecer essas sensações, muitas vezes sem considerar que a origem está naquilo que não é visível ou palpável, está naquele mais profundo sentimento de medo.

Se numa época da história da humanidade precisávamos nos defender de presas reais (leões da savana africana) e o estado de ansiedade era uma ferramenta essencial de sobrevivência, hoje parece que nosso organismo anda atordoado diante de tantos estímulos, sem saber do que se defender. Todas essas apresentações vão encontrar numa consulta psiquiátrica uma fórmula básica, que consiste em medicação + terapia. Sim, é uma fórmula bastante eficaz. Porém continuam sendo transtornos recorrentes, que se repetem ao longo da vida, cuja natureza ainda me é uma incógnita.

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